Uma coreógrafa brasileira no atlântico negro – homenagem à Mercedes Baptista

A morte de Mercedes Baptista (1921 – 2014), na semana passada, motivou nossa conversa de fim de semana. Pouco conhecida nos meios acadêmicos da História, fomos atrás de mais informações sobre aquela que é considerada a primeira mulher negra do corpo de baile do Municipal e uma das fundadoras do balé afro-brasileiro. O melhor resultado da busca foi encontrar o belíssimo livro do pesquisador e professor de Arte e Dança Paulo Melgaço da Silva Jr.

Com um levantamento de entrevistas, jornais e fotografias maravilhosas, Paulo nos apresenta uma Mercedes fascinante e ainda pouco conhecida. Migrante de Campos com sua mãe, começou a vida artística pelas mãos da bailarina Eros Volúsia, do Serviço Nacional do Teatro no Rio de Janeiro, em meados da década de 1940. Eros, na década de 1930, era uma bailarina preocupada em formar um balé brasileiro a partir de temas indígenas, sertanejos, negros e populares.

No final dos anos 40, Baptista conseguiu passar no difícil concurso do Municipal e passou a se engajar num dos mais importantes movimentos negros de então, o Teatro Experimental do Negro, dirigido por Abdias do Nascimento. A partir daí e principalmente depois de ter recebido uma bolsa para estudar balé em Nova York com Katherine Dunham (1909 – 2006) – considerada a fundadora da moderna dança afro-americana, com quem parece ter mantido contato por muito tempo- sua projeção no meio artístico, como dançarina e coreógrafa, consolidou-se. Sempre em articulação com a militância e a arte negra atlântica, inclusive internacionalmente.

Visitando o Brasil em 1950, Katherine Dunham foi recusada em um importante hotel em São Paulo, com grande repercussão, o que parece ter tido influência na aprovação da Lei Afonso Arinos, em 1951. É importante destacar que Duham também tinha formação em antropologia e etnografia e chegou a estudar a dança negra no Caribe em estreito diálogo, nos anos 40, com Melville Herskovits, reconhecido por suas pesquisas sobre a diáspora africana nas Américas. A descoberta da África nos Estados Unidos e nas Américas deve ter, sem dúvida, marcado a trajetória de Mercedes Baptista e a perfomance de sua companhia de Balé, chamada também de Ballet Folclórico. Suas coreografias sobre danças de escravos, sambas, macumbas e candomblés tornaram-se sempre presentes em sua carreira.

Além de ter atuado em companhias de balé, Baptista fez trabalhos para teatro, escolas de samba, televisão e cinema. Entre eles, destacamos a comemoração do Centenário da Abolição da Escravidão, em 1988. Nos dias 12 e 13 de maio, a coreógrafa foi a responsável pela parte dançante da Missa dos Quilombos, espetáculo concebido por João das Neves nos Arcos da Lapa e Paço Imperial. Também a participação de Mercedes Baptista em famosas coreografias do Salgueiro pode ser acompanhada com mais aprofundamento na tese de Doutorado de Guilherme José Motta Faria “Os Acadêmicos do Salgueiro e as representações do negro nos desfiles das Escolas de Samba” (UFF/2014).

Pelo que apresentamos, dá vontade de saber muito mais sobre a produção artística e a trajetória de Mercedes Baptista… Elas merecem muitos outros olhares e investimentos de pesquisa…

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Arquivado em cultura negra, história e memória, história pública

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