Kumbukumbu: África, memória e patrimônio

Significado da palavra kumbukumbu:

“KUMBUKUMBU é uma palavra swahili que significa memória ou recordação. Como a história é considerada o estudo do passado, historiadores recolhem fatos do passado de diferentes fontes. Todas as coleções e documentações dos acontecimentos passados reunidas formam um MUSEU, que basicamente significa KUMBUKUMBU. As exposições dos museus são usadas para mostrar as memórias e as coleções de acontecimentos passados. KUMBUKUMBU evoca a dimensão do passado que nos aponta um caminho para o futuro.”    Gatera Mudahizi Maurice, Tanzânia

Quem está antenado com as novidades na nossa área de interesse já sabe do que se trata o post de hoje, a nova exposição sobre a coleção de África do Museu Nacional, que será inaugurada no próximo dia 14 de maio, às 16 horas. Graças ao trabalho minucioso e apaixonado da historiadora Mariza Soares, Kumbukumbu traz a público um pequeno tesouro que ficou muitos anos escondido. E de quebra uma visão panorâmica sobre as relações entre o Brasil e a África, da chegada da Corte Portuguesa por essas bandas em princípios do século XIX até a primeira metade do século XX.

A exposição está organizada em seis conjuntos  e nove vitrines a partir de uma seleção de temas que emergem dos objetos reunidos na coleção. Segundo a curadora da exposição, “são ao todo 150 objetos trazidos de diferentes partes do continente africano entre 1810 e 1940, acrescidos de objetos que pertenceram ou foram produzidos por africanos ou seus descendentes diretos no Brasil, entre 1880 e 1950”.

Os objetos adquiridos no passado e sua releitura hoje, na nova exposição, são registros não só da diversidade de culturas e da história africana, mas nos contam também um pouco da história do Museu Nacional e de seu olhar de pesquisa para o continente e os povos africanos.

Objetos de povos considerados “exóticos”, como instrumentos religiosos e cotidianos dos povos nômades da floresta equatorial, pejorativamente conhecidos como “pigmeus”,  foram compradas pelo Museu Nacional ainda no século XIX.  O grande destaque é uma enorme escultura feita de presa de elefante.

A violência colonial produziu objetos africanos para museus do mundo todo, o Museu Nacional, principal instituição científica do Brasil, não foi exceção. Armas usadas pelos povos do sul da África, foram compradas ou recebidas em doação pelo Museu durante as guerras coloniais no rio Zambeze (1880-1902). Uma bela coleção de objetos dos povos ovibumdu, do planalto central de Angola, com destaque para uma coleção de bastões Tchokwe, foi doada ao Museu por uma missionária brasileira  que ali residiu entre 1935-1938, período que marca a consolidação do poder colonial português no interior do país, com a implantação do estatuto do indigenato.

A coleção registra, ainda, um tempo anterior.  Marcado pela violência do tráfico atlântico de escravos e por relações diplomáticas entre reis escravistas europeus e africanos.

Segundo Mariza Soares: “Em 1810, o rei Adandozan do Daomé enviou uma embaixada ao Brasil com a missão de negociar melhores condições para o comércio de escravos. Na ocasião os embaixadores trouxeram várias cartas e presentes para D. João, então regente de Portugal. Os presentes formam um importante conjunto que nos dá a medida das relações diplomáticas entre os dois reinos escravistas. O conjunto é composto por um trono, uma bandeira de guerra e outros objetos menores.”

Por fim, como não podia deixar de ser, temos objetos relativos às últimas gerações de africanos e seus descendentes diretos no Brasil  –  milhões de africanos chegados através da diáspora forçada produzida pelo tráfico atlântico de escravos sobretudo no Rio de Janeiro e na Bahia. Ao falar dos africanos e de seus descendentes no Brasil, a exposição nos conta também, mais uma vez, a história intelectual da instituição, em três tempos: o final do século XIX – com objetos apreendidos pela polícia do Rio de Janeiro em casas de candomblé (chamadas “casas de dar fortuna”) na década de 1880, “requisitadas pelo Museu para estudo”;  a década de 1940 – com “objetos comprados pela então diretora do Museu, Heloisa Alberto Torres, de tradicionais casas de Candomblé da Bahia”; e o tempo atual – com resultados das pesquisas arqueológicas recentes do Museu Nacional, com destaque para as coleções de cachimbos de barro.

O fascínio da música africana sempre se fez presente nas imaginações dos estudiosos de todos os tempos. Instrumentos musicais tradicionais, ainda hoje presentes nas modernas culturas africanas, abrem a exposição na vitrine África, passado e presente. Uma sala em que “os objetos falam do passado e de como essa passado marca profundamente a história dos países africanos atuais”.

Poucos sabiam dessas inestimáveis peças sobre a África no Museu Nacional, muito menos  do papel do Museu, e de seus dirigentes, na construção desse acervo.

Imperdivel! Parabéns Mariza! #ficaadica
bandeira Adandozan

bandeira de Adedozan, rei do Daomé.

conjunto Celenia (1)convite web (kumbukumbu)sanza com cabaça

6 Comentários

Arquivado em cultura negra, história e memória, história pública

6 Respostas para “Kumbukumbu: África, memória e patrimônio

  1. Tania Gandon

    Que maravilha! Uma exposição como esta é uma grande contribuição para a compreensão da historia de nosso pais e de noss haerança africana. Parabéns! (desculpem a falta de acentos apropriados neste computador)

  2. Glicia Caldas

    Parabéns prof. Mariza, seria e ainda é, pouco para agradecer os estudos de ponta que ela tem nos proporcionado, fornecendo subsídios para uma leitura atual da contribuição do povo africano na construção da nossa identidade…Nenhum historiador ou prof. de História deve perder essa oportunidade de ver ao vivo e as cores a exposição….

  3. Pingback: Encontros na estrada | conversa de historiadoras

  4. Parabéns! Na verdade, fui ao Museu Nacional em atividade de mestrado, mas foi maravilhoso e após fiquei com a missão de realizar um trabalho de conclusão da disciplina sobre esta sala. Fantástico ver o valor dessa exposição, o que meses atrás eu desconhecia! Como precisamos levar os graduandos, o ensino médio e fundamental em nossos Museus! Desejo sucesso e muitas verbas para o MN!

  5. Papo Coletivo

    Republicou isso em conversa de historiadorase comentado:

    Em Memória do Museu Nacional do Rio de Janeiro, uma tragédia sem precedentes na história da cultura brasileira.

  6. Hi nice rreading your post

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